Texto: Estadão Conteúdo/Band, com edição do AeF
Foto: Pixabay/Band
A administração Trump planeja desenvolver um novo poder de fogo nuclear, que possa tornar mais fácil deter ameaças aos aliados europeus. O plano, ainda não aprovado pelo presidente Donald Trump, teria como objetivo minimizar a possibilidade de um conflito nuclear. CrÃticos, no entanto, argumentam que o resultado seria o oposto.
A proposta faz parte de um documento
conhecido oficialmente como "revisão da postura nuclear", que coloca
os EUA em uma posição nuclear mais agressiva. É a primeira revisão desse tipo
desde 2010 e está entre os vários estudos de estratégia de segurança
empreendidos desde que Trump assumiu o cargo. Em muitos aspectos, reafirma a
polÃtica nuclear de Barack Obama, incluindo o compromisso de substituir todos
os elementos-chave do arsenal nuclear com novas e mais modernas armas nas
próximas duas décadas. O documento diz também que os EUA vão aderir aos acordos
de controle de armas existentes, mas expressa dúvidas sobre as perspectivas
para novos pactos.
A doutrina nuclear de Trump deve ser
publicada no inÃcio de fevereiro,
seguida de uma polÃtica sobre o papel e o desenvolvimento das defesas
norte-americanas contra mÃsseis balÃsticos. A diferença dela para a abordagem de Obama está na intenção de reduzir o papel das armas
nucleares na polÃtica de defesa dos EUA. Como Obama, Trump consideraria o uso
de armas nucleares apenas em "circunstâncias extremas", mas o atual presidente
mantém um grau de ambiguidade sobre o que isso significaria.
Esboço
Um esboço do relatório da polÃtica
nuclear foi divulgado na quinta-feira pela imprensa norte-americana.
Procurado para comentar o assunto, o Pentágono chamou o documento de
"pré-decisório", um relatório inacabado e ainda por ser revisado e aprovado
por Trump, que o ordenou há um ano. A Rússia e, até certo ponto, a China, são
apontados como problemas de polÃtica nuclear que exigiriam uma abordagem mais
dura. A opinião da administração Trump é que as polÃticas e ações russas
estariam “repletas de potencial de erro de cálculo†que levariam a uma escalada
descontrolada de conflitos na Europa. O documento especifica uma doutrina russa
conhecida como "intensificar para
moderar", na qual Moscou usaria ou ameaçaria usar armas nucleares de menor
potência em eventuais conflitos regionais, na esperança de que
isso obrigaria os EUA e a Otan a recuarem na pressão exercida sobre os russos.
A administração Trump propõe uma solução
em duas etapas. Primeiro, uma alteração em um "pequeno número" de
mÃsseis balÃsticos de longo alcance existentes, transportados por submarinos
estratégicos, para adequá-los a ogivas nucleares de menor rendimento. Além
disso, "a longo prazo", os EUA desenvolveriam um mÃssil nuclear de
lançamento marÃtimo, restabelecendo um armamento que existia durante a Guerra
Fria, e que foi aposentado em 2011 pela administração Obama. Juntas, estas duas
etapas estariam destinadas a dissuadir ainda mais a "agressão
regional".
O interesse pela condição e pelo papel
das armas nucleares dos EUA cresceu à medida que a Coreia do Norte desenvolve
seu próprio arsenal nuclear. A administração Trump vê as ameaças
norte-coreanas, juntamente com o que considera uma retórica nuclear provocativa
da Rússia, como evidência de que as condições de segurança já não dão suporte Ã
ideia de que os EUA podem depender menos de armas nucleares ou limitar seu
papel na defesa nacional.
Leitura
Na prática o mundo assiste a uma nova
corrida armamentista, num cenário em que dois antigos protagonistas (EUA e
Rússia), juntam-se a um terceiro (Coreia do Norte) para medir forças em relação
a potenciais nucleares. Entre o fim da Segunda Guerra Mundial e os anos 1980, quando os
ânimos da Guerra Fria se acirraram, a humanidade viveu dias de muita tensão com
a eminência de um holocausto nuclear que poderia dizimar boa parte da vida
humana na terra. Quando o pesadelo parecia ter acabado, voltou para assombrar
novamente quem só deseja levar sua vida em paz no Planeta.
A outra leitura possÃvel do fato é que,
teoricamente, conforme já demonstrou a história, é melhor ter os EUA mediando e
decidindo conflitos bélicos do que nações totalitárias, como a Alemanha de Hitler,
a Itália de Mussolini ou o Japão de Hirohito, por exemplo, que na Segunda
Guerra Mundial colocaram unhas e dentes para fora ao vislumbrar a
possibilidade de subjugar a Europa e a Ãsia – e teriam conseguido não fosse a entrada dos norte-americanos no conflito.
Torcida
Numa época em que um ditador megalomanÃaco,
mimado e fantasiado de divindade, no caso de Kim Jong-un, e um déspota esclarecido
disfarçado de estadista influente, no caso de Vladimir Putin, disputam para ver
quem manda mais, não deixa de ser um tanto providencial que um paÃs de tradição
democrática e longo histórico de respeito à liberdade assuma mais controle
sobre a perigosa situação que foi criada na Europa e na Ãsia.
Resta torcer para que o suposto pacifismo
nuclear de Trump seja uma intenção verdadeira, e não apenas uma desculpa para
deflagrar mais uma guerra, declarada ou não, fria ou quente.