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INICIATIVA PRIVADA DEVE GERIR SANEAMENTO, RECOMENDA NELCIO LINDNER
Sexta-Feira, 28 de Agosto de 2009

Blumenau tem razões de sobra para gerar polêmicas. Não por ser a maior cidade do Vale do Itajaí, com cerca de 300 mil habitantes, o que pressupõe pluralismo de conceitos e valores. Mas por ser a capital acadêmica do Verde Vale do Itajaí.


Um vale já não tão verde, com sérios problemas relacionados à qualidade da água de seus mananciais. Além das históricas catástrofes ambientais.


Mas, deixando as catástrofes sob a égide de São Pedro, vamos às obras coadjuvantes dos comuns mortais, que interferiram gravemente no equilíbrio natural. À medida que a exuberante Floresta Atlântica foi cedendo lugar à colonização, o número de enchentes aumentaram na seguinte proporção, segundo o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí: 1850 – 1900, 11 enchentes; 1901 – 1950, 20 enchentes; 1951 – 2000, 30 enchentes. E observe que a riqueza acumulada pelas pessoas, com o indiscriminado desmatamento, não paga o prejuízo das cheias. Mas isso é só para reflexão introdutória.


E os problemas de nossos recursos hídricos não param por aí. Em 2005, o Vale do Itajaí, através do seu Comitê de Bacia, promoveu uma campanha de conscientização acerca da grave situação de contaminação de seus mananciais, principalmente pelo esgoto doméstico.


A situação era (e continua sendo) semelhante em Alfredo Wagner, Ibirama, Blumenau ou Ilhota, cidades do Alto e Médio Vale do Itajaí. Os coliformes fecais demonstram a inexistência de políticas públicas de saneamento.


Indaial optou pela gestão compartilhada, com a Casan e o poder público atuando em parceria. Obteve bons avanços. Timbó municipalizou os serviços.  Pomerode, assim como Blumenau, possui um Serviço Autônomo Municipal de Ãgua e Esgoto (Samae).


A CONCESSÃO DO ESGOTO COMO ALTERNATIVA


A primeira legislação de saneamento em Blumenau, determinava a necessidade de “tanque (fossa) sépticoâ€. Ineficiente pela própria natureza. Em 1988 a lei foi aprimorada acrescentando o “filtro anaeróbioâ€.  Eficiência dos dois: 50% e olha lá. Estes sistemas são privados, de responsabilidade do cidadão.


O primeiro projeto de  â€œSistema Público de Tratamento de Esgoto Doméstico†data do início dos anos 1990. Com eixo coletor principal na rua Amazonas e transversais até o 23 BI. A estação foi construída no baixo Ribeirão Garcia (rua Lions Club), com capacidade para tratar o esgoto de 15 mil pessoas.


Passados 15 anos, esta estação trata o esgoto de apenas 7 mil pessoas, por absoluta falta de responsabilidade ambiental dos cidadãos e incompetência do Samae que não usa os recursos jurídicos de que dispõe.


Em 2005, atendendo aos apelos dos agonizantes peixes das fétidas águas, o poder local de Blumenau anunciou, como compromisso de governo, tratar 50% do esgoto até 2010.


Mas Blumenau precisa ser célere na implantação da rede de coleta, tratamento e disposição do esgoto para manter o índice, já que a imigração incha a cidade mais do a capacidade de atender à demanda. Teremos 560 mil habitantes em 2050.


Dada a incapacidade de investimento do poder local, a administração optou pela “concessãoâ€. Concessão não é privatização, como alguns entendem. Mas, como cada um entende o que lhe convier, o “qüiproquó† está feito. Mesmo não sendo “experto† em saneamento, muito menos em políticas (que deveriam ser) públicas, arrisco algumas ponderações, considerando profundo respeito ao comitê contra a “privatizaçãoâ€. Este comitê, aliás, desempenha um imensurável papel no aperfeiçoamento do processo. Sem ele não teremos os aperfeiçoamentos necessários. No futuro,  ninguém poderá dizer  “ninguém falou, ninguém disse,...â€. Se cometermos um erro, este será de “toda sociedadeâ€!


Neste momento, 300 mil pessoas sabem que está em marcha um processo de CONCESSÃO para coleta, tratamento e disposição do esgoto doméstico em Blumenau.


FALTA DE INTERESSE DA POPULAÇÃO?


Todos sabem, poucos estão se mexendo. Desculpem, mas a população não está nem aí. Quer ver?


O aquecimento global e as mudanças climáticas estão aí, na mídia diariamente. Mas, quando o filme “Uma verdade inconveniente†esteve em cartaz num dos cinemas de Blumenau - fui assisti-lo com minha esposa -,  Pasmem: fomos as ÚNICAS pessoas na sala de cinema. Na audiência pública sobre a concessão, o “povo†não estava nem aí.


Então...


Do centro desta arena são oportunas algumas indagações que alguém precisa responder ou confirmar:


1) A administração local de Blumenau, nunca teve capacidade de implantar um sistema de transporte urbano.  Fez concessão.


2) O Governo Federal tem capacidade de atender à toda demanda de energia elétrica? Não. Então, qual a alternativa? A concessão a consórcios. Mas, resguardando o pátrio poder do controle sobre qualidade de serviços e  preços. O mesmo se aplica à telefonia. Mais de 120 milhões de brasileiros atendem, felizes, seus celulares.


3) Então: considerando a urgente necessidade de melhorar a qualidade das águas superficiais e a incapacidade local de investimento na área, a concessão é um instrumento através do qual poderemos resolver parte dos problemas ambientais imediatos. Sem esquecer, claro, um FORTE  mecanismo social/democrático de regulação. Uma Agência de Saneamento.  


A agência local de saneamento é o nosso Samae. O que se poderia melhorar é a representatividade do conselho gestor. Assim como tem o Conselho Municipal de Meio Ambiente, haveria um Conselho Municipal de Saneamento, com efetiva participação da população organizada E COM PODER DELIBERATIVO.


De modo geral, as pessoas desconfiam da competência financeira do Estado na gestão das coisas públicas. Quer dizer, o Estado não consegue fazer mais ou melhor que a iniciativa privada. Abaixo, a transcrição do resumo de um artigo científico, cujos autores são José Carrera Fernandez e Anderson Luis Silva de Oliveira:


 


“Este artigo compara a eficiência com que as empresas de propriedade pública e privada prestam os serviços de saneamento básico no Brasil. A análise buscou detectar possíveis diferenças entre esses dois agrupamentos de empresas, tanto nas suas estruturas de alocação de recursos quanto nos seus níveis de utilização de insumos por unidade de produto, assim como nas suas respectivas escalas de produção.


Utilizando modelos de fronteira determinística, foi possível quantificar medidas de eficiência produtiva (técnica e alocativa) e econômica (custo e de escala) para as empresas que operam nesse setor. Avaliaram-se os possíveis vieses no nível de utilização de capital e trabalho por unidade de produção e na relação capital-trabalho, assim como se estimou o efeito de tais diferenças sobre a estrutura de produção, custo e lucro desses dois tipos de empresas.


Os dados mostraram que não há nas estatais qualquer indício de super-emprego de recursos (capital e trabalho) por unidade de produto, quando comparados com os níveis verificados nas empresas privadas. No entanto, observou-se que as estatais apresentam um viés importante na alocação dos insumos no sentido de utilizar mais capital por unidade de trabalho, relativamente às empresas privadas.


Apesar da ineficiência na alocação dos recursos produtivos, este viés não causou qualquer impacto estatisticamente significativo sobre a eficiência produtiva e a estrutura de custos dessas empresas relativamente às empresas privadas. No entanto, constatou-se que o agrupamento de empresas públicas foi sob o ponto de vista econômico menos eficiente que o conjunto das empresas privadas, indício suficiente da adoção de escala inapropriada de produçãoâ€



Tirem vossas conclusões, que eu tiro as minhas:


1) É preciso definir claramente um Plano Municipal de Saneamento, articulado com as demais demandas de infraestrutura de Blumenau, tais como uso do solo, transporte, água, lixo. Estas questões devem estar devidamente articuladas com a lei 11445/07.


2) Temos que fazer uma opção. Esta deve ser a opção da ampla maioria da população de Blumenau. A opção pelos peixes e outros organismos da biota aquática ou pelo bolso dos consumidores. De qualquer forma, a legalidade é um princípio moral e ético. 


Por Nelcio Lindner, professor do Senai, pós-graduado em Administração de Recursos Naturais e mestre em Gestão da Qualidade Ambiental. Também é diretor do Instituto Parque das Nascentes.




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