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GALINHA IMPORTA MAIS DO QUE TURISTA, APONTA ESTUDO
Segunda-Feira, 12 de Novembro de 2012

Em reunião com lideranças do PIB blumenauense, na Associação Empresarial de Blumenau (Acib), representante da empresa Macrologística detalhou, na manhã desta segunda-feira, o estudo denominado Sul Competitivo, que pretende orientar investimentos na área de infraestrutura dos três estados da região Sul (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul).  O clima do encontro foi acalorado e não faltaram críticas ao enfoque, enquadramento e metodologia do levantamento, principalmente pelo fato de que ele não aponta a duplicação da BR-470 como prioridade. Confira o que argumentaram algumas das fontes ligadas à economia da região:


Paulo Cesar Lopes, presidente da CDL de Blumenau: o estudo realizado pela Macrologística não leva em conta as demandas de logística que deixaram de ser geradas a partir do momento em que novas empresas deixaram de se instalar no Vale do Itajaí, por falta de uma rodovia duplicada. Assim, ao se diminuir a importância da duplicação da BR-470, em comparação com outras obras consideradas mais urgentes por transportarem maior volume de cargas, estaria se penalizando os municípios afetados pela rodovia duas vezes.


Alfredo Lindner Jr., arquiteto e conselheiro da Acib: a metodologia utilizada para o levantamento desconsidera o fato de que, se a BR-470 ainda não é um obstáculo tão grande para o escoamento de mercadorias, como argumenta a Macrologística, não se pode dizer o mesmo em relação ao fluxo de veículos e pessoas. A lentidão do trânsito e os congestionamentos, lembrou Lindner, dificultam a locomoção de quem procura os serviços oferecidos na região, entre os quais turismo, por exemplo. Como a economia de Blumenau vem se focando cada vez mais justamente na prestação de serviços com alto valor agregado, acaba penalizada na tabulação de dados do Sul Competitivo, que avalia apenas as demandas da indústria de transformação.


Adilson Baher, presidente do Conselho de Desenvolvimento da Itoupava Central: questionou a equação adotada pela Macrologística para determinar os níveis de saturação de cada rodovia avaliada pelo estudo. A fórmula, elaborada no ano 2000, leva em consideração elementos como velocidade média, tempo de frenagem, distâncias entre veículos e percurso total do trajeto. Na opinião de Baher estaria desatualizada. O representante da empresa de consultoria, Luiz Fernando Ferreira, argumentou que fórmulas e equações matemáticas são menos suscetíveis a atualizações e que desconhece versão mais atual  daquela utilizada no estudo.


Ronaldo Baumgarten Jr., presidente da Acib: os ganhos de competitividade gerados para as empresas não entram no cálculo do tempo necessário para que cada um dos investimentos seja pago. Assim, considera-se apenas a redução do custo de transporte de cada um dos modais a serem contemplados como a expansão logística. A melhora da performance das empresas beneficiadas com a ampliação da infraestrutura e seu consequente impacto na arrecadação de impostos, por exemplo, não entra na conta.


OPINIÃO DO PORTAL


Toda tentativa de se orientar e racionalizar decisões e projetos de investimentos públicos é bem vinda. Principalmente no Brasil, onde os critérios políticos costumam se sobrepor aos técnicos quando se decide onde aplicar os recursos da administração pública. Neste sentido, os objetivos do Sul Competitivo são louváveis e certamente oxigenam o ambiente da governança estatal.


O que não se pode, contudo, é confundir objetividade com reducionismo. Delimitar o foco de um objeto, portanto, não é o mesmo que reduzir-lhe o número de recortes. Para uma mesma pesquisa, muitas vezes, é preciso, sim, mais do que um estrato. Não raramente, é preciso ir além de um único recorte do objeto.


Neste sentido, o estudo elaborado pela Macrologística é de fato deficiente. Considera apenas as demandas da indústria de transformação, da velha economia, da produção de commodities. A oferta de serviços com alto valor agregado, dentro da qual Blumenau vem se destacando, é solenemente ignorada, como se não fosse importante para o desenvolvimento econômico, quando, na verdade, vem se transformando, há muito tempo, em um dos pilares mais sólidos da economia mundial.


No cenário descrito pelo Sul Competitivo, um estado acostumado a produzir tecnologia e inovação, como Santa Catarina, corre o risco de ver sua infraestrutura colocada mais a serviço da agropecurária e da agricultura do que da indústria de ponta. Milho, café, soja e carne processada, por exemplo, seriam mais importantes para o Sul do país do que software, moda, eletroeletrônica e turismo, atividades que agregam muito valor e vêm diferenciando as nações no quesito competitividade.


Uma empresa como a blumenauense Hering, que hoje vende mais conceito do que roupa propriamente dita, faturando na casa de R$ 1 bilhão, seria menos importante do que um criador de aves do Oeste catarinense, considerando que os artigos têxteis ficaram de fora da lista dos produtos mais transportados pelas rodovias de SC, enquanto as cargas frigoríficas de aves recortadas estão no topo deste ranking. É triste, mas é verdade.


Por isso a gritaria que se viu na Acib na manhã desta segunda-feira faz sentido e merece ser relevada. Uma região tão acostumada à inovação, ao pioneirismo e ao desenvolvimento sustentado não pode ser penalizada por agregar valor à sua indústria e diferenciá-la em termos de tecnologia. Se o país tem orgulho de ser um exportador de commodities, ajudando a alimentar o crescimento da China e de outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento, que o seja, mas sem penalizar justamente aqueles que querem caminhar no sentido contrário, agregando valor e inovação a sua cadeia produtiva.


Pensem nisso, senhores consultores e gestores públicos, antes que seja tarde demais e o país afunde na crise, tão logo os chineses parem de crescer a níveis estratosféricos (o que já está começando a acontecer) e passem a consumir menos minério de ferro, soja e carne do Brasil. Se não tivermos tecnologia e valor agregado para oferecer ao mundo, num futuro não muito distante, voltaremos ao tempo da colônia, quando ficávamos à míngua assim que os europeus decidiam tomar menos café com açúcar. Abram o olho, senhores, só não vê o risco quem não quer.




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