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RELAÇÕES TRABALHISTAS MERECEM REGULAÇÃO GLOBAL
Terça-Feira, 07 de Maio de 2013

O caso do desabamento de uma fábrica têxtil em Bangladesh, no Sul da Ãsia, expõe muito mais do que o drama das quase mil famílias que perderam parentes entre as centenas de trabalhadores mortos na tragédia. O episódio expõe um problema que na verdade afeta milhões de pessoas em todo o mundo, que interfere diretamente na organização econômica e social de uma penca de nações ao redor do globo. Afinal, por trás da famigerada competitividade asiática, que vem engolindo a indústria mundial, está uma série de fatores sociais e estruturais que deveria ser levada em conta pela Organização Mundial do Comércio (OMC), que acaba de eleger o brasileiro Roberto Azevedo como diretor-geral.


O primeiro destes fatores são os salários extremamente baixos oferecidos “do outro lado†do mundo. Enquanto no Brasil o salário mínimo é de aproximadamente 300 dólares, em Bangladesh é de apenas 37, quase dez vezes menos. Assim, fica bem mais fácil para a indústria têxtil do país asiático abrir vagas de trabalho e atrair investimentos estrangeiros. Enquanto isso, deixa-se de criar um número enorme de vagas por aqui, onde o mercado de trabalho não anda lá tão exuberante assim. É preciso começar a pensar, portanto, em algo como uma espécie de salário mínimo internacional, a ser pago por multinacionais em qualquer parte do mundo onde decidam produzir para exportar ou simplesmente fazer private label. Por mais heterodoxa que possa parecer tal proposta, ela poderia ajudar a equalizar o mercado internacional e ainda valorizaria os paupérrimos trabalhadores asiáticos – lembrando que a China também se utiliza do expediente de subvalorizar a mão-de-obra, o que vem aumentando os níveis de desigualdade social no gigante asiático.


O segundo fator a facilitar a vida da indústria asiática é a inexistência de uma cobertura trabalhista mais ampla, com direitos mais extensos para os trabalhadores. Se no Brasil os encargos sociais chegam a dois terços do que ganha uma assalariado, em Bangladesh eles mal cobrem o corpo de quem trabalha nas fábricas de artigos têxteis, por exemplo. Assim como a questão do salário mínimo, portanto, a das leis trabalhistas também deveria entrar na pauta de discussões do comércio mundial, com vistas a uma regulamentação mais abrangente.


Um terceiro aspecto a se observar no céu de brigadeiro que espera por quem deseja abrir uma fábrica na Ãsia, pelo jeito, são as facilidades para se edificar uma planta sem maiores incômodos com fiscalização e segurança. Para desabar como um castelo de cartas sobre a cabeça de mais de 700 pessoas, afinal, não é possível imaginar que a edificação de Bangladesh (onde estavam sediadas quatro confecções diferentes) obedecesse a padrões mais rigorosos e seguros de construção civil.


Regulação global e vergonha na cara


Caso não se estabeleça mecanismos internacionais que possam equalizar melhor os níveis de competitividade e seguridade social do comércio mundial, então, que as grandes multinacionais criem vergonha na cara e parem de se aproveitar da mão-de-obra semiescrava e degradante oferecida pelas nações asiáticas – excluindo-se desta lista o Japão e a Coreia do Sul, evidentemente. Estes, aliás, sequer sediam multinacionais, pois criam as suas próprias, inovando e desenvolvendo tecnologia. E certamente oferecem condições de trabalho e salários muito melhores do que Bangladesh e China, por sinal.


As multinacionais que estão produzindo na Ãsia para exportar para o mundo precisam perceber que produzir neste ambiente, com o objetivo de aumentar lucros, é exatamente o mesmo que comprar madeira nobre de matas nativas para decorar mansões em Berverly Hills e contribuir com o desmatamento das florestas. É uma atitude irresponsável, condenável, egoísta e mesquinha.


Por isso, em última instância, quem deveria regular melhor este mercado macabro é o consumidor, evitando comprar artigos fabricados em países que exploram seus trabalhadores de forma quase desumana. Quando for a uma loja de departamentos fazer compras, portanto, lembre-se de conferir a etiqueta, onde está a procedência do produto. Dê preferência aos fabricados em nações idôneas do ponto de vista trabalhista. Se as autoridades do comércio mundial e os grandes magnatas do PIB não têm juízo, tenha você um pouco, pelo menos.


 


 




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