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QUEM CONSEGUE APRENDER FRITANDO OS MIOLOS?
Terça-Feira, 11 de Fevereiro de 2014

Toda dificuldade, todo desafio, todo obstáculo colocado na trajetória de um ser vivo tem como objetivo levar a um processo de evolução. Charles Darwin já dizia isso, há dois séculos, sem que até hoje ninguém tenha conseguido provar que ele esteja errado.


Assim, quando você comete um erro e tem discernimento para reconhece-lo, ou quando se coloca objetivos em cujo caminho estão dificuldades claras e perceptíveis, está diante da oportunidade de rever conceitos, aprimorar procedimentos e caminhar mais firme em direção a um resultado evolutivo consistente – seja na instância pessoal seja na profissional. Aprimora-se até mesmo características genéticas quando o assunto é vencer um desafio para atingir um fim. O pescoço das girafas, os dentes e garras do leão, as guelras de um peixe. Estão ali única e exclusivamente para que estes animais sejam mais competitivos e vivam melhor, transferindo esta capacidade para seus descendentes, que, por sua vez, enfrentarão novos desafios, precisarão de nova evolução e, assim, formarão novas gerações, às vezes completamente diferentes das ancestrais. Um processo sucessivo, regular e indispensável para o ciclo da vida na Terra.


Desconexão


Por isso é de se lamentar as oportunidades de aprendizado e evolução que se perde na esfera pública. Ali parece realmente não haver muita conexão entre o mundo real e o faz-de-conta dos gabinetes estatais. Perde-se toda e qualquer possibilidade de evolução natural, ignora-se desafios, erros, objetivos e metas como se estes não fossem prerrogativa de quem administra o bem comum.


Tome-se como exemplo a forte onda de calor que assola o Brasil e Santa Catarina neste início de ano – assim como a já quente por natureza Blumenau. O país, o estado e a cidade enfrentam algumas das médias de temperatura mais altas da história, numa onda de aquecimento que fez suar até mesmo os termômetros, desacostumados que estavam a tanto trabalho. Um drama com diferentes implicações, inclusive no aprendizado.


Algumas escolas chegaram a rever o início do calendário letivo, à espera de uma trégua da temperatura. Outras optaram por mante-lo e receberam alunos e professores, nesta segunda-feira, com ventiladores pregados no teto ou na parede – quando eles estão lá. Com raras e honrosas exceções, construídas à base de heroísmos coletivos ou individuais (na escola blumenauense Adelaide Starke, por exemplo, os professores do pré e da primeira série colocaram aparelhos por conta própria, em busca de mais conforto para si e para os alunos), as condições que se oferece nesta época do ano a estudantes e mestres são deploráveis. Como bem lembrou o cidadão em reportagem recente da TV, ar refrigerado já não é mais um dispositivo de conforto, é uma ferramenta de trabalho. Afinal, como uma pessoa pode produzir ou aprender com os neurônios fritando na ante-sala do inferno?


Colocar pessoas em um recinto fechado, sem climatização, em plena onda de calor histórico, é mais uma destas provas de que o poder público, no Brasil, trata o cidadão como se ele fosse a parte menos interessada na gestão do patrimônio público.  Por outro lado, recorrer ao cancelamento das aulas pelo simples fato das escolas não terem refrigerador de ar, em pleno século 21, também é prova adicional de que as políticas e instituições públicas não estão conseguindo resolver os problemas da sociedade, que precisa de mais educação, e não menos.


Banana e mamão


Ao gestor público local que apareceu comparando o Brasil com os EUA (onde as aulas chegam a ser canceladas em dias de neve mais rigorosa), portanto, é preciso fazer saber que lá a interrupção ocorre por conta da falta de acesso ou dos riscos que ele impõe a quem precisa se locomover pelo gelo em direção à escola. Não é em função da temperatura, pois as unidades educacionais do Tio Sam têm, sim, calefação.


O que ele tentou fazer foi uma comparação de pesos e medidas diferentes, colocando mamão de um lado da balança e banana do outro. Uma coisa não tem nada tem a ver com a outra, é impossível aferir parâmetros comuns entre ambos.


Aqui, caros e nobres gestores públicos, o problema é simples de resolver, basta refrigerar as salas de aula e pronto. Dinheiro para isso, inclusive, haveria de sobra, se vocês não colocassem tantos recursos fora com má gestão ou falta de comprometimento e ética.  


Do princípio ao fim


Voltando ao início para chegar ao fim, então, precisamos lembrar que esta pode ser uma das mais fortes ondas de calor, mas não é a primeira nem tampouco será a última. Principalmente no Vale do Itajaí, onde os estudantes sofrem com o calor improdutivo que faz na região há muitos e muitos anos, há várias e várias décadas. Por que, então, não são premiados com a instalação de refrigeradores de ar nas escolas? Porque a gestão pública não aprende com seus erros, não busca aprimorar sua conduta através de uma reavaliação de seus procedimentos. A esfera estatal não evolui, não se prepara, não se desenvolve. Não se rende a Darwin, não se coloca no plano da dimensão real.


E também porque o Brasil não liga a mínina para a educação, é claro. Prefere um povo mal formado, ignorante, que continue elegendo seus representantes em troca de migalhas. É exatamente por isso que gasta-se bilhões e mais bilhões todo ano com a distribuição de esmolas ao povo/eleitor mas não coloca-se um único refrigerador de ar nas salas de aula do país. Mas de que adianta dar dinheiro ao cidadão que matricula os filhos se as escolas às quais eles estão sendo mandados não oferecem condições mínimas de conforto e aprendizado? Tema para reflexão profunda.


A secretária de Educação do município, Helenice Luchetta, foi procurada para comentar a falta de refrigeração nas escolas e a iniciativa dos professores da Escola Básica Municipal Adelaide Starke, mas não foi encontrada. De acordo com uma assessora, ela estava em reunião e por isso não pôde atender aos telefonemas do portal.




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