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SERVIDOR DEVE SER VALORIZADO, CIDADÃO TAMBÉM
Segunda-Feira, 02 de Junho de 2014

É preciso deixar uma coisa bem clara: nenhum cidadão com o juízo no lugar é contra a valorização do servidor público. Aliás, todo brasileiro que gozar de perfeita saúde mental saberá que se os recursos públicos fossem geridos com mais responsabilidade e eficiência, daria para pagar melhor ao funcionalismo e ainda sobraria para investir mais em infraestrutura, educação, saúde e segurança. O dinheiro que nos arrancam com os impostos, no entanto, não raramente vai parar em causas bem menos nobres, digamos.


O problema é que as greves no setor público (na iniciativa privada elas são cada vez mais raras) prejudicam justamente o cidadão, e não os mal feitores da gestão pública. Elas privam o contribuinte dos já escassos serviços públicos, não os cartolas do colarinho branco de seu champagne com caviar. Por isso fica difícil para a população apoiar movimentos que prejudiquem a já difícil vida do trabalhador, como está ocorrendo agora com a greve dos servidores públicos de Blumenau.


Neste contexto, seria formidável se as forças organizadas do segmento desenvolvessem novos mecanismos de pressão sobre a gestão pública. Quais? Não sabemos ao certo, mas o que se sabe é que tudo nesta vida precisa se adaptar e evoluir para se perpetuar. Darwin mostrou isso de forma cabal e indiscutível.


Então, se a humanidade precisou abandonar a crença no geocentrismo para aderir ao heliocentrismo porque pôde perceber através de imagens que era a Terra que girava em torno do Sol e não o contrário, precisa rever também alguns de seus métodos e paradigmas de ação social, para adaptar-se a novas realidades e constatações. Alguém precisa repensar os mecanismos de mobilização de classe, as iniciativas de pressão corporativa, os arranjos sociopolíticos que dão vida ao tecido social. As atuais estruturas, como se percebe, estão ficando ultrapassadas, já não dão mais os resultados que deveriam dar.


Alternativa


Uma alternativa interessante aos mecanismos convencionais de reinvindicação corporativa seriam as novas tecnologias e ferramentas de comunicação. Já pensou se cada um dos oito mil servidores públicos de Blumenau utilizasse as redes sociais e e-mails para expor suas insatisfações e assim comprometer a imagem do gestor público? Se os sindicatos fizessem o mesmo, com a estrutura e o orçamento que têm, montando campanhas de e-marketing e as veiculando pelos canais disponíveis? Possivelmente teriam bem mais chances de emparedar ou mesmo ameaçar a eleição das figuras públicas que combatem.


Bônus da responsabilidade


Outro aspecto importante a se considerar nesta avaliação: como ficam os servidores que preferiram não parar, ou que voltaram ao trabalho antes dos colegas. Terão algum prêmio por isso? Serão beneficiados de alguma forma?


Afinal, tem-se uma desproporção notável nessa história. Das 78 creches públicas de Blumenau, três estão funcionando normalmente, 21 operam parcialmente e 53 estão paralisadas, segundo informação oficial. Entre as escolas do ensino fundamental, 16 não pararam, 9 pararam parcialmente e 25 interromperam todas as atividades.


Assim, portanto, é possível concluir que nem todos os servidores concordam com a greve. É evidente que, caso a persistência dos colegas que permanecem paralisados dê resultado, eles também serão beneficiados. Mas, se ocorrer o que ocorre na maioria das vezes, em que o obtido está muito aquém do desejado, qual será o bônus de quem preferiu manter o cumprimento de suas responsabilidades para não prejudicar o cidadão?


Parece factível, neste contexto, que o desconto de dias parados, a partir de determinado ponto de uma greve, seja uma forma justa de diferenciação entre quem para e quem não para. Afinal, uma coisa é parar dois ou três dias em protesto, outra estender-se por mais de uma semana, às vezes meses, num movimento que, repita-se, prejudica o cidadão, não o gestor público.


Conquistas


Que os servidores possam ser bem sucedidos e obtenham as conquistas que merecem, mas que também possam ter o juízo necessário para não prejudicar a população. E o prefeito Napoleão Bernardes (PSDB), diga-se de passagem, que não esqueça o episódio antes de pensar nas próximas promessas que fará. Afinal, a principal reivindicação dos servidores é o cumprimento de compromisso assumido em campanha, segundo o qual perdas salariais de 30% seriam repostas ao funcionalismo durante o mandato. Meta absolutamente impraticável, como se sabe, pela situação dos cofres públicos no Brasil – principalmente o dos municípios.


Qualquer um dos quatro candidatos à época, aliás, estaria se vendo agora com a cobrança dos servidores, pois todos fizeram a mesma promessa. Sobrou para Napoleão. De certa forma, os funcionários públicos têm razão. Mas não adianta manter um sonho quando sua realização é impossível e a luta para realizá-lo prejudica mais gente do que beneficia. É tratar as coisas no campo do surreal, onde não há possibilidade de materialização objetiva.


Por isso é hora de rever conceitos, senhores, todos vocês, pois é ao povo que resta trabalhar para bancar toda essa guerra de interesses, em que poucos ganham e muitos perdem. Pensem nisso.




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